O despertar da primavera

Recebo alguns e-mails pedindo minha opinião sobre o aborto feito na menina de Pernambuco, a excomunhão etc. Eu preferia não falar desse assunto, porque os dados que vêm pela imprensa nessas coisas são sempre muito duvidosos. Aliás, tirando o blog Tubo de Ensaio, os grandes veículos sempre nos presenteiam com textos embaraçosos; aparentemente, ignorar o que a religião diz a respeito de si mesma é obrigatório para o jornalismo religioso brasileiro. Enfim.

Vamos começar com dois links para a edificação geral:

1. Grávida de gêmeos em Alagoinha: o Pe. Edson Camargo, que acompanhou a família da menina estuprada até o ponto em que uma assistente social o permitiu, conta o que presenciou.

2. Menina estuprada de 9 anos é a mãe mais jovem do Peru: o que sugere que é possível ter filhos com essa idade. Não sei como era o caso da menina de Alagoinhas, se havia alguma complicação; mas, como não li nenhum boletim médico, eis aí ao menos algum contexto.

Agora, sobre a excomunhão, bem, não sou canonista e não tenho a mais mínima vontade de me juntar a defensores do aborto no ataque a um bispo. Quero só levantar algumas perguntas. Primeiro, até onde vai meu parco entendimento, a Igreja permite o aborto como efeito negativo de uma intervenção positiva. Assim, se um aborto for parte de uma intervenção cirúrgica que salva a vida da mãe, a Igreja o permite. Se a mãe quiser ter o filho e morrer, a Igreja admira o sacrifício, mas não o estabelece como padrão de conduta. Pelo pouquíssimo que li sobre esse caso, ele parecia cair nessa situação. Digo “parecia” porque aparentemente a gravidez era a própria causa do risco de vida, e não um obstáculo no caminho de outra coisa. E, francamente, não conheço um único especialista brasileiro em direito canônico que possa tirar a dúvida.

De todo modo, entre as condições necessárias para a excomunhão, estão 1. a consciência de que a Igreja prescreve a pena de excomunhão para
determinado ato (como a prática do aborto) e 2. a ação deliberada e suficientemente livre. Creio que 1. a mãe não sabia da pena (normalmente só os militantes anti-aborto sabem dela) e 2. a mãe estava pressionada demais pelo terror da situação e até pela assistente social.

Comme d’habitude, na grande imprensa não se ouviu nenhuma defesa dos pobres bebês que a menina gerou. O aborto é mesmo o único “bem” que nunca é advogado para si mesmo.

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