11 anos de O Indivíduo

Hoje completam-se 11 anos da confusão na PUC do Rio que deu origem não a O Indivíduo, mas ao nosso desejo de ter um site – ou melhor, que fez o Sergio de Biasi ter a boa idéia de criar um site, comprar um domínio etc. Não é o caso de recontar pela enésima vez toda a história; se paro para falar do aniversário, é só porque acredito que há uma observação oportuna a fazer sobre mim mesmo e sobre como me posiciono em relação ao “projeto original” de O Indivíduo.

Continuo igualmente incomodado com o discurso padronizado, acadêmico ou jornalístico, que mais e mais parece fechar-se em si mesmo. Mas hoje entendo que isso, em parte, são ossos do ofício: uma linguagem padronizada também pode fazer um bem danado, e eu mesmo adoraria que alguns de meus autores favoritos tivessem a bondade de produzir um glossário padronizando os termos que eles mesmos gostam de usar. Isso, porém, não os livraria do grande risco da padronização, que é uma mudança no foco da imitação. Se você pretende compreender algo “como fulano compreendeu”, precisa esforçar-se para imitar certos atos da consciência individual testemunhados por aqueles termos, em vez de simplesmente aprender a falar de um certo modo ou adquirir certos trejeitos.

O esforço sincero e – por que não? – piedoso de compreender alguma coisa acaba trazendo a percepção de certas possibilidades da consciência e da sua própria vida, e aqui começa a reflexão que me interessa hoje. Ao colocar-se contra todos, ao ver-se marginal, o sujeito corre o risco de simplesmente tomar como verdade aquilo que considera uma versão invertida do suposto senso comum. Às direitas e às esquerdas vemos que o maior pecado continua sendo tomar o verossímil pelo verdadeiro, como é amplamente testemunhado por aquilo que se tem dito sobre Barack Obama, e, claro, ter reações emocionais em torno desse verossímil que, muitas vezes, é inverificável. Barack Obama não é o fim do mundo, nem o começo de um mundo novo, e essas duas frases são absolutamente poéticas, além de serem de mau gosto.

Esforçar-se para ser de esquerda, de direita e sobretudo para “não ser de esquerda nem de direita”, para estar “acima da manada” é um esforço para construir uma identidade pública. Embora eu mesmo goste de ter uma certa identidade pública, devo admitir que esse esforço não está relacionado ao entendimento das coisas. E devo admitir que um excelente começo para o entendimento das coisas está na busca do entendimento de si mesmo. Se você é um partidário forte de uma ideologia e gosta de se definir pela negação do lado oposto, faça a si mesmo a pergunta do caminho de Damasco: “Por que os persigo?” Talvez você perceba que a (suposta) perfeição dos seus argumentos é muito maior do que a das suas motivações.

Por isso gosto da visão do conhecimento que aparece em muitos textos antigos: como uma posse, uma capacidade que o sujeito adquire, não como algo que independe do sujeito que conhece. Como se no ponto ideal houvesse uma convergência entre teoria e arte, entre intelecção e prática, como se a prova da verdade conhecida estivesse mesmo na sua obediência. Obediência essa que vem em parte do amor e em parte da percepção inevitável de que agir de outro modo é mera futilidade. Talvez, aliás, esse amor e essa percepção sejam a mesma coisa, ou tenham a mesma origem, mas ao menos em mim se manifestam como dois sentimentos distintos. O amor pelas coisas me impulsiona e a sensação de futilidade me diz a hora de parar. É o famoso modus in rebus.

Enfim. Depois de 11 anos, minha proposta continua a mesma, mas talvez a formulação seja diferente. Não nos preocupemos tanto com a nossa identidade pública, não a ponto de nos impedir de falar sinceramente das coisas que amamos.

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