Joseph Campbell, aquele sujeitinho

Quando eu tinha 19 anos, li muito Joseph Campbell. Comecei, naturalmente, com The Power of Myth, passei para The Hero with a Thousand Faces e li boa parte da série The Masks of God. No fim, rejeitei-o pela mesma razão que rejeitei Jung. Os dois pareciam mais interessados em estimular uma certa atitude intelectual do que em discutir qualquer coisa. Esta atitude, por sua vez, é extremamente perniciosa. Por trás de uma aparência de temor por aquilo que é sublime, há uma séria dificuldade em apontar inequivocamente este sublime. Não tenho nenhum problema com um muçulmano declarado. Conheço nossas diferenças. Mas não gosto nem um pouco de quem vem me dizer que reverencia a Virgem Maria porque ela é um profundo símbolo de qualquer coisa. Negue ou afirme a sua crença na virgindade de Maria – o desrespeito, aliás, está na maneira como você a afirma ou nega, e não na sua afirmação ou negação – , mas não venha tentar me convencer sutilmente de que ela na verdade é outra coisa.

Sempre quis escrever algo sobre Campbell, mas para isso eu teria que reler seus livros, que vendi para o sebo há uns bons anos. Encontrei, porém, um artigo de Mortimer Adler que começa a tratar deste verdadeiro Frithjof Schuon da patuléia intelectual. Aqui, um trecho de That Campbell Fellow:

Campbell entendia que ainda que os mitos tenham verdade poética, o tipo de verdade que existe em todas as histórias inventadas, eles não têm a verdade factual e lógica que se encontra em narrativas históricas e no corpus das ciências. Portanto, ele entendia a diferença entre verdade poética e verdade lógica, já que era, ele próprio, cientista social. Devia entender os critérios segundo os quais a verdade das generalizações da sociologia ou da antropologia cultural pode ser testada, provada e refutada, critérios que ele mesmo não aplicaria às narrativas poéticas ou mitologias. Daí que de sua afirmação de que todas as religiões são mitologias malentendidas se depreenda que, ainda que elas tenham verdade poética, sejam “factual e logicamente falsas”.

Pode ser verdade que algumas religiões sejam mitologias malentendidas que têm verdade poética, mas não factual ou lógica. Mas Campbell dizia que era assim com “todas” as religiões. Esta é uma generalização irrestrita da parte dele, que ele fez enquanto cientista social e antropólogo cultural.

Como Campbell embasou a verdade de sua generalização científica? Com argumentos lógicos? Não. Com provas que, em sentido estritamente lógico, têm força probatória? Não. Como, então? Por meios puramente retóricos, por mal-disfarçados jogos verbais que almejavam desmoralizar, e não refutar, as crenças religiosas.

(…)

Por fim, em Fire in the Mind, chegamos à expressão “siga sua bênção”, que sintetiza as exortações de Campbell sobre como viver a vida, supostamente destilada de toda a “sabedoria” que encontrou nas mitologias do mundo.

Essa expressão, apesar do grandioso ar de mistério e sofisticação com que Campbell a proferia, expressa o mais ingênuo dos hedonismos: “Faça o que quiser se você sentir prazer”. Talvez essa seja a “sabedoria” da Nova Era, mas representa o mais baixo aviltamento da cultura do século XX.

O livro em que Adler desenvolve mais longamente seus argumentos contra Campbell é Truth in Religion.

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