Velhos e novos-ricos

Ontem conversei muito com um amigo (que não tem blog nem nada) sobre um dos fenômenos que mais me chamam a atenção no Rio de Janeiro: a extrema diferença cultural entre os velhos e os novos-ricos.

Se você vai – quase digo ia, porque eles estão literalmente morrendo – à casa de um velho-rico, morador de qualquer bairro do Rio, chamaria a sua atenção o amor pelas coisas do Brasil. Ele se orgulharia de te oferecer um biscoito delicioso produzido por uma obscura senhora numa cidade de algum interior. Mostraria os móveis e explicaria a sofisticada técnica com que são produzidos por algum excelente artesão de sei lá onde, mas no Brasil. Falaria, com os olhos brilhando, sem a menor afetação, com admiração verdadeira, de como as pessoas em tal lugar do Brasil encontraram um jeito fantástico de se adaptar às suas circunstâncias, e riria até com algum orgulho da engenhosidade delas. E lembraria coisas que seus pais, avós e tios fizeram, e as pessoas que conheceram, transmitindo a sensação de uma grande comunidade, que começava invariavelmente na família. Tudo isto em pleno português, em português que hoje seria considerado literário, com a rara intromissão de uma palavra estrangeira, que viria sempre acompanhada de alguma explicação – “como falam os italianos, isso é…”

Se você vai à casa de um novo-rico, ou mesmo de um rico novo, a primeira coisa que você nota é que a cada cinco palavras portuguesas vem uma inglesa, freqüentemente adaptada, e não estou falando dos termos informáticos: até hoje, minhas favoritas foram bypassar (to bypass, mas com o sentido português de “passar por cima”: “ele vai me bypassar” significa ele vai armar alguma coisa sem o meu conhecimento) e bullshitagem, que eu não preciso explicar. Pais, avós, tios nunca são mencionados, mas sim os médicos com tratamentos modernos, os psicólogos, os personal trainers e, naturalmente, as coisas sempre adquiridas em exagero. Chama a atenção como um velho-rico tem a noção perfeita da sua necessidade ou desejo e então procura o que melhor lhe atende, e um novo-rico tem um pressentimento de um desejo e já quer comprar o melhor e maior objeto da sua categoria. A impressão que você tem é que, se ele pudesse comprar um foguete para levar as crianças à escola que fica no mesmo bairro onde ele mora, ele compraria.

Isso não significa, é claro, que estes novos-ricos não sejam boa gente, não sejam simpáticos, legais etc. Mas é nítido que eles, que enviam seus filhos a escolas bilíngües, não sentem a menor relação com o Brasil. É até fácil de entender que, num país que só demonstra ojeriza a um empresário que trabalha, e deposita esperanças em burocratas que só parasitam, eles, até por prudência, prefiram lembrar-se constantemente de que só estão aqui porque estão ganhando dinheiro e porque, acredite, até para muitos deles morar numa metrópole americana ou européia com o mesmo padrão de vida sairia caro demais.

Porém, a ruína de qualquer lugar com toda certeza começa pela elite. Eu não sei o que sucedeu com a geração dos meus avós que não soube replicar-se, mas sei que a geração dos meus pais já se acredita um novo começo, já se sente desligada da tradição, descompromissada com todo o passado, e que a geração imediatamente posterior a essa não só tem um descompromisso idêntico como é composta de pessoas que acreditam que, por ter ganhado dinheiro, são, como dizem os americanos, os “mestres do universo”, os novos jesuítas que com seus gráficos e planilhas vão “modernizar” o Brasil – desde que, é claro (e nisso eles têm razão) o Brasil não encha muito o saco.

Eu, aos 29 anos, sou apenas um sujeito perplexo, procurando uma saída particular, pessoal, e os mais novos já parecem estar completamente integrados naquilo que julgam ser uma grande cultura internacional anglo-falante.

Se eu fosse um romancista, escreveria sobre isso.

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