Temas que faltaram na campanha presidencial

Falei dos motivos da vantagem petista, mas isso não significa isentar a fraca campanha tucana da culpa por ter permitido esse resultado.

Era uma tarefa muito difícil vencer a máquina lulista (tanto assim que nada adiantou a atuação infinitamente superior de Alckmin nos debates), mas a lista (não exaustiva) do que faltou ressaltar ao longo da campanha dá a medida da inépcia do PSDB e seus aliados. Ei-la:

– Lulinha, a Gamecorp e a Telemar;

– as preferências eleitorais do PCC;

– a aliança entre Lula e Chávez, e deste com as FARC;

– Evo Morales;

– a promessa de Fidel Castro de “recuperar na América Latina aquilo que se perdeu no Leste Europeu”;

– as ameaças à liberdade de imprensa;

– os benefícios das privatizações;

– os riscos econômicos do ressurgimento do estatismo petista;

– o fim da independência das agências reguladoras;

– a origem do controle da inflação e seu efeito na vida popular;

– a ONG “Rede 13” (ou “Amigos de Plutão”);

– a existência de figuras que dirigem das sombras (ou das trevas) o governo petista, como evidenciado pela participação de José Dirceu na compra do falso dossiê;

– o aumento da violência no campo em razão do governo petista;

– os gastos dos cartões corporativos;

– o termo “golpe” para designar o mensalão e a compra do dossiê ? por falta de uso, acabou sendo usurpado pelos próprios golpistas do PT para designar a revelação de seus crimes pelos tucanos e pela imprensa;

– o aparelhamento da máquina estatal e seus efeitos imediatos na vida da população. Um exemplo didático: a diretora da ANAC, que revelou todo o seu despreparo ao bater boca com jornalistas e com parentes das vítimas sobre o resgate dos corpos no acidente com o avião da Gol (chegando a pronunciar a famosa frase “depende do que você define como um corpo”), estava lá por ser apadrinhada de José Dirceu (putz, sempre ele!).

E assim por diante. Todos esses temas poderiam ? e deveriam ? ter sido expostos de forma direta, clara e didática no horário eleitoral ou em discursos de aliados de Alckmin.

Mas, não. A campanha se perdeu num debate inócuo sobre “quem fez mais”, com a exibição das obras e programas sociais de Alckmin em São Paulo, fugindo dos temas mais relevantes e do confronto direto com a corrupção e a inépcia do Governo Lula.

Pior: no 2º turno, quando a discussão esquentou, Lula sempre tinha dezenas de apparatchicks para atacar o candidato tucano dizendo as maiores atrocidades (como Tarso Genro, Marco Aurélio Garcia, Jacques Wagner e muitos outros), Alckmin tinha de responder a tudo sozinho, enquanto seus aliados estavam muito ocupados brigando entre si. Era a eles (e não ao candidato propriamente) que cabia espalhar o debate sobre todos esses temas, e apontar todos os pontos fracos do PT.

E agora, em vez de prometer oposição ferrenha ao Governo que se avizinha, os tucanos ainda dão azo a conversas de “aproximação”, e mostram-se prontos para ajoelhar-se no altar do lulismo em nome da “governabilidade”.

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Governabilidade

A ausência de governabilidade é a melhor coisa que poderia advir para o país. Mas isso não acontecerá. Mesmo que os tucanos tomem jeito, o PMDB (o verdadeiro “partido da boquinha”) e os partidos do mensalão se encarregarão de garantir a aprovação dos projetos de interesse do Governo. A começar por essa grotesca “reforma política”, que tomará dinheiro dos pagadores de impostos para financiar as campanhas dos partidos (é o tal “financiamento público das campanhas”) e impedirá as pessoas de votar nos candidatos a deputado de seu interesse (é a tal “voto distrital com lista”).

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Projeto Gabão

Não se iludam com essa história de que Lula não vai deixar sucessor.

O Projeto Gabão ? inspirado no encantamento de Lula a esse magnífico país africano, governado pelo mesmo ditador há quase 40 anos ? continua firme e forte, e certamente ganhará novo vigor com o resultado das eleições.

Anotem aí. Se Lula não for posto para fora do poder em razão do dossiê ou de novos escândalos ainda por vir (hipótese reconhecidamente remota, dada a inépcia das oposições e o aparelhamento petista das instituições), certamente investirá todas as suas energias em fazer seu sucessor ? que poderá ser Tarso Genro, Dilma Roussef, Jacques Wagner, ou até mesmo (por que não?) o próprio Lula.

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Vocabulário eleitoral

Há um ótimo artigo no Globo de hoje sobre o vocabulário legado pelos petistas depois destas eleições.

Transcrevo os melhores trechos (sem link por impossibilidade técnica do site do Globo):

‘ELITE: É o que impede o presidente Lula e o ex-presidente Sarney de libertar o povo nordestino do jugo de suas oligarquias. Seu QG é a Avenida Paulista e seus preconceituosos integrantes não precisam do Estado e de universidades. Nem têm dor de dente.

NUNCA ANTES NESTE PAÍS: No “luminoso” reinado do PT, onde tudo é grandioso e inédito, a expressão serviu para criar um novo marco da civilização, não apenas nacional, mas planetário. Assim surgiu o calentário que divide os tempos entre a.L. (antes de Lula) e d.L. (depois de Lula).

GOLPISMO: Por tradição, é a tentativa de tomar o poder por vias não democráticas. Na era d.L., tornou-se sinônimo da divulgação, pela mídia e pela oposição, de investigações sobre os escândalos do PT e do governo. A publicação de fotos que são notícia e o direito constitucional do sigilo da fonte fazem parte da conspiração. Se continuar em destaque, o resultado do trabalho da PF e do Ministério Público vira, a partir de hoje, “terceiro turno”, o outro apelido do golpismo.

DEMISSÃO: É o que acontece quando o dirigente do PT ou membro do governo, flagrado no “erro”, é obrigado, apesar de apelos, elogios e afatos de Lula, a sair pela porta dos fundos do governo, o que o Diário Oficial registra como demissão “a pedido”. Se for preciso, Lula dirá mais tarde que o demitiu.’